Prefácio Intelectualíssimo ou De minha infância (Atualizado ao fim)
Arremesso de Apagador
Embora seja uma modalidade extremamente perigosa, e apenas uma vez na história de minha infância presenciada com tanto ímpeto, é digna de nota: consiste primeiramente no abiscoitar de um dos apagadores da sala antes de aula, e, durante a mesma, arremessá-lo em direção às costas da professora; no caso, acertando pouco mais de um palmo a sua direita, o que o estatelou violentamente no quadro negro. O evento resultou na expulsão da metade direita da sala de aula, já que o jovem aluno responsável pelo arremesso era por demasiado amedrontador para ser encarado pela professora de matemática sozinha.
Arremesso de Cadeado
Modalidade consideravelmente mais violenta, especialmente porque, na situação em questão, o objeto de arremesso é não só mais denso quanto efetivamente acertou seu alvo, no incisivo esquerdo. Resultou do stress entre membros de um grupo de trabalho sobre as vanguardas artísticas do Século XX.
Apagador
O apagador é um protagonista de diversas histórias da referida década, constituindo objeto canalizador de grande energia rebelde, pois poderia ser permanentemente roubado, arremessado, utilizado para emporcalhar uns colegas ou ser colocado secretamente nas mochilas de outros, com intuito de sujar seu material, de incriminá-los pelo roubo, ou de fazê-lo sentir-se mal pelo fato de que havia trazido um apagador da escola para casa.
A Descoberta da Cropofilia
Um dos membros do grupo, renomado pela sua infinita capacidade de criar nomes ofensivos a seus colegas que se espalhavam instantaneamente e ad eternum, e pelas suas inigualáveis capacidades nos jogos derivados de tetris, pega uma lata de coca cola vazia e coloca-a delicadamente sobre fezes de cavalo. Em seguida, a oferece a seu colega – este, marcado pela sua homofobia patológica precoce - que aceita-a de bom grado e a coloca na boca. Descobrindo-a vazia, percebe que fora engambelado pela turma - já que todos estão rindo de sua pessoa. Após minutos dolorosos de riso, o evento ficou conhecido como “Quando ele comeu merda”, embora seja sabido que ele somente encostou seu lábios aonde ela havia sido colocada.
A Vendeta
Após o evento cropofílico, foi intentada – inclusive, com grande ajuda dos outros colegas presentes que não participaram do primeiro evento, mas que não negariam uma possibilidade de participar de algo tão grandioso – a infâme depreciação da escova-de-dentes alheia. Isto foi feito por diversos membros do quarto da turma, e foi acompanhado de fotos que comprovam que a escova serviu tanto para limpar as solas dos sapatos dos colegas quanto para lustrar a privada.
Tentativa de Assassinato
Descobrimos a certa altura do ginásio que podiamos enforcarmo-nos mutuamente, com consentimento igualmente mútuo, com intuito de desmaiarmo-nos. A diversão individual consistia no momento da perda da consciência, antecipando o que buscaríamos anos depois com o alcool. A diversão coletiva, é claro, consistia na perda da consciência alheia.
A prática era logicamente muito cautelosa, e tomavamos o cuidado de que ninguém caísse de costas no chão. Um belo dia, porém, um colega caiu de cara e quebrou uns dentes ou o nariz ou algo que o valha. A diretora endemoninhou-se (termo de acordo com a tradução do aramaico dos evangélios sinóticos de humberto rodhen) e acusou o aluno executor de tentativa de assassinato, embora fosse todo um ritual coletivo e que o executir fizesse apenas a parte de maior responsabilidade - mas as diretoras e orientadoras provavelmente estudam pedagogia, e não semiótica, e, logo, falham em perceber o intrincado sentido cabalístico de cada um desses rituais. Talvez seja justamente isso que ensinam na faculdade de pedagogia: tornar-se uma entidade odiada por todos os alunos que ama, e, desta forma, ensiná-los exatamente como não se deve proceder. Mártires, as diretoras. O ofício mais nobre da civilização.
Embora seja uma modalidade extremamente perigosa, e apenas uma vez na história de minha infância presenciada com tanto ímpeto, é digna de nota: consiste primeiramente no abiscoitar de um dos apagadores da sala antes de aula, e, durante a mesma, arremessá-lo em direção às costas da professora; no caso, acertando pouco mais de um palmo a sua direita, o que o estatelou violentamente no quadro negro. O evento resultou na expulsão da metade direita da sala de aula, já que o jovem aluno responsável pelo arremesso era por demasiado amedrontador para ser encarado pela professora de matemática sozinha.
Arremesso de Cadeado
Modalidade consideravelmente mais violenta, especialmente porque, na situação em questão, o objeto de arremesso é não só mais denso quanto efetivamente acertou seu alvo, no incisivo esquerdo. Resultou do stress entre membros de um grupo de trabalho sobre as vanguardas artísticas do Século XX.
Apagador
O apagador é um protagonista de diversas histórias da referida década, constituindo objeto canalizador de grande energia rebelde, pois poderia ser permanentemente roubado, arremessado, utilizado para emporcalhar uns colegas ou ser colocado secretamente nas mochilas de outros, com intuito de sujar seu material, de incriminá-los pelo roubo, ou de fazê-lo sentir-se mal pelo fato de que havia trazido um apagador da escola para casa.
A Descoberta da Cropofilia
Um dos membros do grupo, renomado pela sua infinita capacidade de criar nomes ofensivos a seus colegas que se espalhavam instantaneamente e ad eternum, e pelas suas inigualáveis capacidades nos jogos derivados de tetris, pega uma lata de coca cola vazia e coloca-a delicadamente sobre fezes de cavalo. Em seguida, a oferece a seu colega – este, marcado pela sua homofobia patológica precoce - que aceita-a de bom grado e a coloca na boca. Descobrindo-a vazia, percebe que fora engambelado pela turma - já que todos estão rindo de sua pessoa. Após minutos dolorosos de riso, o evento ficou conhecido como “Quando ele comeu merda”, embora seja sabido que ele somente encostou seu lábios aonde ela havia sido colocada.
A Vendeta
Após o evento cropofílico, foi intentada – inclusive, com grande ajuda dos outros colegas presentes que não participaram do primeiro evento, mas que não negariam uma possibilidade de participar de algo tão grandioso – a infâme depreciação da escova-de-dentes alheia. Isto foi feito por diversos membros do quarto da turma, e foi acompanhado de fotos que comprovam que a escova serviu tanto para limpar as solas dos sapatos dos colegas quanto para lustrar a privada.
Tentativa de Assassinato
Descobrimos a certa altura do ginásio que podiamos enforcarmo-nos mutuamente, com consentimento igualmente mútuo, com intuito de desmaiarmo-nos. A diversão individual consistia no momento da perda da consciência, antecipando o que buscaríamos anos depois com o alcool. A diversão coletiva, é claro, consistia na perda da consciência alheia.
A prática era logicamente muito cautelosa, e tomavamos o cuidado de que ninguém caísse de costas no chão. Um belo dia, porém, um colega caiu de cara e quebrou uns dentes ou o nariz ou algo que o valha. A diretora endemoninhou-se (termo de acordo com a tradução do aramaico dos evangélios sinóticos de humberto rodhen) e acusou o aluno executor de tentativa de assassinato, embora fosse todo um ritual coletivo e que o executir fizesse apenas a parte de maior responsabilidade - mas as diretoras e orientadoras provavelmente estudam pedagogia, e não semiótica, e, logo, falham em perceber o intrincado sentido cabalístico de cada um desses rituais. Talvez seja justamente isso que ensinam na faculdade de pedagogia: tornar-se uma entidade odiada por todos os alunos que ama, e, desta forma, ensiná-los exatamente como não se deve proceder. Mártires, as diretoras. O ofício mais nobre da civilização.