Furor Sintético e Suspeita
Discutimos sobre manifestações do exercício do poder, e desvelamos esse exercício a própria causa daquilo que justifica esse exercício (toma-se uma propriedade, exerce-se poder para sua manutenção e justifica-se o exercício deste poder na existência de ‘desviados’ que querem tomar para si esta propriedade que já não é mais coletiva, etc.).
E acontece que esse passo é muito claro, pois nos é evidente que colocar pessoas convivendo entre si num sistema de propriedade privada leva inevitavelmente a uma serie de crimes de subversão dessa propriedade, porque naturalmente tanto os que a tem quanto os que não a tem desejam-na.
No entanto, embora o poder em função da manutenção da propriedade privada represente boa parte do nosso exercício de poder, resta ainda o poder exercido sobre a aberração psíquica, o desviado moral, para conter suas práticas nocivas à nós. Este é identificado como essencialmente desarmônico, como inconciliável. São as crianças que ‘estragam’ sempre os brinquedos, e assim justificam que o brinquedo x seja só do irmãozinho que ‘cuida’ das coisas; justificam também que o que estragou seja castigado, embora saibamos que isso não vai mudá-lo. essa pessoa não pode ser convencida a não 'estragar' as coisas, ainda que sejam coletivas: ela precisa ser restringida, caso contrário estraga, estupra e abusa. Mas não é bem uma pessoa, a gente identifica 'essa pessoa' sempre em particulares, e então generalizamos num conceito (mas embora estejamos falando de medidas não aparentes, de algo que não existe, estes conceitos nos servem como ferramentas de compreensão, mas só podem nos servir de qualquer coisa se estivermos atentos a o que estamos fazendo com ele).
Não pretendo aqui investigar a causa de cada desvio, mas só questionar: será que é possível que eles sejam mesmo ‘desviados naturais’, ‘desviados sem causa’, que continuariam se proliferando aos montes ainda que todo o poder governamental (ou dos pais) fosse exercido contra o exercício do poder de si mesmo, ainda que vivêssemos em completa e hegemônica anarquia? Porque estes casos me parecem a última alternativa, o único material sobre a qual se justifica todo o exercício do poder – porque só na atribuição de desvios ‘sem causa’ é que seria vão todo o trabalho de identificação e subversão de causas deste desvio e produtivo somente o trabalho na direção da coerção dos desviados. Só se pode obrigá-los, forçá-los, prende-los e puni-los. Em suma, aquela mesma coerção que o próprio Skinner identificou como ineficiente e produtora de comportamentos horríveis diversos.
Ainda, estas causas, para que sejam desveladas, requerem um trabalho 'genealógico' minucioso que não costuma caber em discussão alguma. A preguiça, o horror ao tamanho de um texto ou à complexidade (quantidade de elementos) de uma discussão repelem-nos de tudo o que não seja senso comum. Mas resta a discussão, a pergunta (serão estes desvios também causados por algum exercício do poder que poderia ser combatido, ou seriam realmente eles inevitáveis?).
Temos como informação: estes desvios sempre estiveram ai, repetindo-se por todos os lados. Temos nomes para quase todos eles, sabemos reconhecer sua presença em toda a história. E os exercícios do poder suspeitos de serem suas causas estiveram também sempre por aí.
O que eu costumo fazer é apontar que essa suspeita é absolutamente legitima e merece muita atenção, ainda que na forma de suspeita e não de discurso verdadeiro. E o que costumam fazer comigo é apontar que minha suspeita é infundada justamente porque ambos estiveram sempre aí - e a produção de um discurso que, embora seja reconhecidamente infundado, pretende-se como ‘substituto’ do conhecimento, como uma ‘verdade mais provável’ e superior de alguma forma à suspeita.
Nesse furor sintético, nesse desejo de não terminar a conversa de mãos vazias, é melhor uma verdade provável do que uma suspeita legítima. Porque Suspeita não é nem tese, nem antítese nem síntese, ela quase que não é - só tem valor quando consagrada, quando deixa de ser suspeita.
E acontece que esse passo é muito claro, pois nos é evidente que colocar pessoas convivendo entre si num sistema de propriedade privada leva inevitavelmente a uma serie de crimes de subversão dessa propriedade, porque naturalmente tanto os que a tem quanto os que não a tem desejam-na.
No entanto, embora o poder em função da manutenção da propriedade privada represente boa parte do nosso exercício de poder, resta ainda o poder exercido sobre a aberração psíquica, o desviado moral, para conter suas práticas nocivas à nós. Este é identificado como essencialmente desarmônico, como inconciliável. São as crianças que ‘estragam’ sempre os brinquedos, e assim justificam que o brinquedo x seja só do irmãozinho que ‘cuida’ das coisas; justificam também que o que estragou seja castigado, embora saibamos que isso não vai mudá-lo. essa pessoa não pode ser convencida a não 'estragar' as coisas, ainda que sejam coletivas: ela precisa ser restringida, caso contrário estraga, estupra e abusa. Mas não é bem uma pessoa, a gente identifica 'essa pessoa' sempre em particulares, e então generalizamos num conceito (mas embora estejamos falando de medidas não aparentes, de algo que não existe, estes conceitos nos servem como ferramentas de compreensão, mas só podem nos servir de qualquer coisa se estivermos atentos a o que estamos fazendo com ele).
Não pretendo aqui investigar a causa de cada desvio, mas só questionar: será que é possível que eles sejam mesmo ‘desviados naturais’, ‘desviados sem causa’, que continuariam se proliferando aos montes ainda que todo o poder governamental (ou dos pais) fosse exercido contra o exercício do poder de si mesmo, ainda que vivêssemos em completa e hegemônica anarquia? Porque estes casos me parecem a última alternativa, o único material sobre a qual se justifica todo o exercício do poder – porque só na atribuição de desvios ‘sem causa’ é que seria vão todo o trabalho de identificação e subversão de causas deste desvio e produtivo somente o trabalho na direção da coerção dos desviados. Só se pode obrigá-los, forçá-los, prende-los e puni-los. Em suma, aquela mesma coerção que o próprio Skinner identificou como ineficiente e produtora de comportamentos horríveis diversos.
Ainda, estas causas, para que sejam desveladas, requerem um trabalho 'genealógico' minucioso que não costuma caber em discussão alguma. A preguiça, o horror ao tamanho de um texto ou à complexidade (quantidade de elementos) de uma discussão repelem-nos de tudo o que não seja senso comum. Mas resta a discussão, a pergunta (serão estes desvios também causados por algum exercício do poder que poderia ser combatido, ou seriam realmente eles inevitáveis?).
Temos como informação: estes desvios sempre estiveram ai, repetindo-se por todos os lados. Temos nomes para quase todos eles, sabemos reconhecer sua presença em toda a história. E os exercícios do poder suspeitos de serem suas causas estiveram também sempre por aí.
O que eu costumo fazer é apontar que essa suspeita é absolutamente legitima e merece muita atenção, ainda que na forma de suspeita e não de discurso verdadeiro. E o que costumam fazer comigo é apontar que minha suspeita é infundada justamente porque ambos estiveram sempre aí - e a produção de um discurso que, embora seja reconhecidamente infundado, pretende-se como ‘substituto’ do conhecimento, como uma ‘verdade mais provável’ e superior de alguma forma à suspeita.
Nesse furor sintético, nesse desejo de não terminar a conversa de mãos vazias, é melhor uma verdade provável do que uma suspeita legítima. Porque Suspeita não é nem tese, nem antítese nem síntese, ela quase que não é - só tem valor quando consagrada, quando deixa de ser suspeita.